ENXERGAVA TUDO PRETO, PONTILHADO COMO SE TIVESSE CAIDO EM UM APARELHO FORA DO AR, CHAPISCADO CALEIDOSCÓPIO NEGRO DE VERÃO. SENTADA NO BARCO CONTINUEI IMÓVEL DE CORPO, POR QUE A MENTE TINHA A VORAZ ÂNSIA DE ESCREVER QUALQUER COISA, QUALQUER LINHA ABSURDA, DESNUDA, AGUDA , FELPUDA, CASACUDA, LÍRICA, TESUDA, CARNUDA, DUVIDOSA, ASQUEROSA, SEI LÁ...

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011



Os dois conversam muito intensamente, até demais.

O gordinho... gordinho não, gordo mesmo. Falava, gesticulava. Parecia uma galinha sem pescoço e ainda soltava uma fumaça pela grande boca enfurecida (oh! essa viagem foi boa). Fumava um cigarro meio charuto, vagabuuundoo, igual feito em casa. Os velhos, falavam alto alto alto, ai no meio da história falavam baixiiinho, depois ficavam quietos, e riam riam riam muito. O que seria tão engraçado?

O outro respondia ao fumante em monossílabos empolgados, abria o peito e. Fiquei um tempo vendo mesmo, não tinha nada pra fazer. E os dois estavam engraçados, o fumante gesticulava tão desesperado que imaginei um jogo na final, o time perdendo... de muito, ou ganhando, mas ganhando bem! E então como fosse um milagre, o outro despontou a falar, mas falava contido, do jeito dele, o ruim é que eu não escutava direito, muito baixo...

Foi então o fumante fez uma cara de susto, encheu o peito de ar, ficou gigantesco e pá.pá.pá!! O outro se apressou e soltou três tapas na altura do peito dele.

Ih!! Corri a rua para separar os velhos. Quase na briga, os dois perceberam minha corrida e eu é que me dei mal. Levantaram os braços e fizera uma barreira, na correria, não deu para parar... cai de cabeça, bati com a nuca, podia ter morrido. E os velhacos rindo, rindo rindo...

Vocês estavam brigando agora tão rindo, que porra é essa? Falei levantando. E é que perdi uns pelos da barriga. Olha aqui, parece depilação! Mostrou o fumante; estava sem camisa, avistei uma capoeira na floresta da barriga. E o outro ria ria ria, dizendo: Ramos, o cigarro dele é bauum... bauum merrmo! Riam riam riam deixando a rua, e eu me senti um imbecil. E ainda por cima, ter o mesmo nome. Fiquei com a maior cara de bunda, e ele percebeu que eu achei que era pra mim aquele baum baum merrmo!

Baum baum merrmo! Isso é engraçado! Vou falar pra galera, eles vão se amarrar. Tomara que pensem que é minha, eu que inventei... e os velhinhos muito doidos. Eu fumo e eles ficam doidões, será que daqui a uns 75 anos vou ser assim também? (rindo sozinho) tenho certeza que eles estavam chapados, é a festa dos vovôs... bauum bauum merrmo!!

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

vida desperta


dizem que para descobrirmos que estamos sonhando precisamos apertar o interruptor, simples assim... se a luz tiver acabado? ou não reconhecermos os interruptores de nossas Casas? tudo não passaria de um sonho? é! preciso de um cigarro... e se minha vida for uma obra a ser criada? tenho a estranha e incomoda sensação de que estou deixando algo essencial para trás, confluência de forças, abstrações, uma aqui, outra ali... mas isso não é tormento, é existência.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Esperar faz-nos perceber qualquer coisa que passa distraidamente... estava ali, só por estar. Ouvi um ruído quase perto. Espiei um menino falando com uma gaiola. A simbiose: o menino e seu pássaro. Percebi, ao chegarem mais perto, que a gaiola estava vazia e mesmo assim ele dizia, falava impunemente a ancestral língua dos pássaros. Linguagem mágica e divina na fluidez do ar

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A água da chuva refresca pensamentos... experimente pluvioencorajar-se e pular para fora das marquises e toldos da vida... a energia que emanamos às moléculas chuvis entrega-lhes um poder sublime, renovando a magia de enxergar a poesia do corriqueiro, do que passa a todo momento, do que ali está...transbordando, cíclica, escorrendo.
Sonhei que estava num lugar com o céu todo colorido, de nuvens algodoadas densamente pinceladas por cores vibrantes aveludadas, lantejuoladas, estreladas, suspirantes, intrigantes... palavras engravidadas, milhares delas, pendiam das nuvens formando um desenho ainda mais intenso. O que diria aquela chuva?

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

8 adormecido



Steichen Gulerff por Man Ray

submersa nas águas de uma banheira escura... caverna descontínua e remota. De repente, uma força misteriosa (explosão) embriaga-me de vontade de emergir e acordar dum sono profundo. Sonâmbula ainda... percebo. A força, de poesia plena, é o que me faz perpétua. Es tu. Belicoso ao meu lado

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

o trabalho em migalhas


Choveu como eu nunca tinha visto antes. O céu enegreceu num estalo, sinfonia única. A parede densa e molhada apontava para nossa direção. Roupas voavam do varal, árvores envergavam torturadas por gotas imensas e trovões, trovões iludiam o desabar do mundo... muito medo, um medo sórdido, catatônico, diferente, escorregadio de estranheza

Mudamos as coisas de um lugar para outro umas cem vezes, tudo encharcava ou molhava, sem jeito. Vivíamos um tempo insólito, não sabíamos há quanto tempo chovia, nem prevíamos quando pararia, se é que... a água evaporava indiferente a qualquer súplica, mantinha-se cíclica, impiedosa. Nuvens rebolando no céu em densos panos pretos acinzentados, talvez estivessem cansadas de serem nuvens simplesmente. Foi tudo tão rápido que durou uma eternidade; o rio, a transformação, a turgidez insolúvel das águas, a desilusão dos cantos perdidos... um mar de pernas pro ar... a única coisa que sabíamos era que devíamos segurar a estrutura da casa.

Na estiagem, a floresta assumiu um verde novo, reluzente, quase uma barbaridade. Os passarinhos cantavam assustados o milagre da vida. O canto de guerra, como se quisessem defender seus ninhos. Ninhos construídos pela paciência do operário que sai em busca de cada fiapinho, agregando-os um a um, em trabalho árduo, saborosamente sem fim, o trabalho em migalhas... Observávamos. Na ânsia de vê-lo terminar sua casa