ENXERGAVA TUDO PRETO, PONTILHADO COMO SE TIVESSE CAIDO EM UM APARELHO FORA DO AR, CHAPISCADO CALEIDOSCÓPIO NEGRO DE VERÃO. SENTADA NO BARCO CONTINUEI IMÓVEL DE CORPO, POR QUE A MENTE TINHA A VORAZ ÂNSIA DE ESCREVER QUALQUER COISA, QUALQUER LINHA ABSURDA, DESNUDA, AGUDA , FELPUDA, CASACUDA, LÍRICA, TESUDA, CARNUDA, DUVIDOSA, ASQUEROSA, SEI LÁ...

sábado, 25 de outubro de 2008

Carranca, pirata de todos os mares


Carranca era o mais horripilante pirata de todos os mares.


Também era o mais feio, o mais mal-humorado, o mais briguento, o mais egoísta e mais; mais tudo de ruim que tiver no mundo inteiro.


O pirata de todos os mares não tinha amigos, tampouco uma tripulação para comandar em seu caveirento navio.


Viajava sozinho com uma perna de pau falante que fora amaldiçoada, há muitos anos atrás, pela Feiticeira Ecritela, conhecida como nariz de tomada.


A tagarela perna já tinha ganho vida própria.


Tinha até nome, chamava-se Nenhumpio.


Era tão independente, que nem parecia fazer parte do corpo de Carranca.


Um belo dia, navegando para a imensidão do sem fim, Nenhumpio avistou uma cristalina garrafa boiando.


– CARRRRAAANCA! GARRAFA À VISTAAAA! – gritou a perna bamboleando.


– Controle-se criatura!! – respondeu trocando o rumo da embarcação.


Seguiram em direção a garrafa.


Chegando bem perto dela, o pirata de todos os mares jogou uma rede para pescá-la.


– O que é? O que é? O que é? – desesperava-se a perninha.


– Quer parar com isso?!


– Foi você quem começou! Para que tanto mistério? – queixou-se a perninha impaciente.


– Não seja tolo, seu pedaço de pau insuportável! – e argumentou nervoso. – O dono pode estar por perto, precisamos nos disfarçar.


Carranca vestiu um fabuloso cocar multicolorido para o caso de passar algum navio.


Pronto! Estava pronto.


Agora era impossível que desconfiassem de alguma coisa.


Abriu a garrafa, cuidadosamente, para não danificar o envelhecido papel que estava dentro dela; quase um pergaminho.


No pergaminho tinham uns escritos estranhíssimos, talvez até de um povoado ainda não descoberto.


Mas, no meio daquele bololo de letras minúsculas, o pirata de todos os mares descobriu um X vermelho levemente apagado.


– UM TESOURO!


– xiiiiiii!


Nenhumpio engoliu a empolgação.


A viagem em busca do tesouro começou imediatamente.


Navegavam navegavam navegavam... durante dias e noites.


Nunca fizeram uma viagem tão grande em busca de um tesouro.


“Deve ser enorme”, pensava o pirata todos os dias.


Chegaram a uma ilha deserta, muuuito distante.


Lá, da praia, contaram trinta e três passos, dezessete coqueiros, duas palmeiras imperiais, cinco pitangueiras, dois macacos (que com passar do tempo já tinham um filhotinho), treze pedras arredondadas, um bambuzal verde e amarelo, uma poça d’água suja e...


– O TESOURO!


– Cale-se Nenhumpio! A floresta pode nos ouvir... – disse baixinho.


Carranca cavou, cavou e cavou de novo, até que... pá!pá!pá! a terra ficou dura como pedra. Tinham achado alguma coisa.


Então o pirata de todos os mares retirou do buraco um enorme baú.


“Bem como eu esperava”, pensou ele.


– Nouuussa! Estamos ricos mil vezes infinito!


Quando Carranca abriu o emperrado baú, tanto a contente perninha tagarela como ele próprio ficaram desapontados.


– Mas o que é isso?


– Parecem coisas de neném.


– Não sou cego Nenhumpio! Isso deve ser alguma brincadeira!


Carranca impaciente e com as mãos para traz começou a andar de um lado para o outro.


Enquanto isso, Nenhumpio analisava o tesouro, mas sem conseguir vê-lo direito, pois o pirata de todos os mares não parava quieto, e a perninha era um pouco míope, ainda mais, quando estava em movimento.


– Olha! Tem muita coisa de prata, a gente pode vender na cidade.


Carranca reparou que, pela primeira vez, Nenhumpio tinha razão. Agarrou o baú e começou a fazer o caminho de volta.


Passando pela poça d’água suja, pelo bambuzal, as pedras... chegando bem onde estava a família de macacos, cruzou com um senhor de uns setenta anos, que o parou e perguntou para ele sobre o baú.


– Achamos primeiro seu velhaco! Precipitou-se a perninha


– Continue marujo. – disse Carranca


– Meu bom homem, estou há setenta anos procurando este tesouro. Tem uma coisa nele que me pertence... somente uma coisa.


– Darei o que é seu de direito por uma condição.

­

– Senhor... é apenas o último pedido de um ancião.


– Como chegou aqui? Se nós estávamos com a garrafa?


– Vinha nadando do mar vermelho em busca dessa garrafa perdida. Foram tantos anos, muitíssimos anos..
Até que avistei uma luz cristalina refletindo na água. Percebi eufórico! Mas vocês foram mais rápidos do que eu.


Carranca e Nenhumpio fitaram os pés do velho e perceberam que ele tinha guelras enormes.


Com certeza tinha vindo nadando.


– Veja lá o que vai escolher! – aconselhou o temido pirata, largando o baú no chão.


O homem ajoelhou-se diante do baú e começou a jogar toda aquela quinquilharia para o alto.


Retirou do fundo do baú uma chupetinha transparente, de plástico.


– Obrigada! Ainda bem que vocês gritaram que a garrafa estava à vista, assim pude me aproximar do barco e ver...


– Veja seu paspalho! Fica gritando o que não deve. – dirigiu-se a Nenhumpio


– Se acalme seu pirata, não foi por isso que eu vim parar aqui, na verdade, foi só coincidência.


– Coincidência?


– Observe que eu cheguei pertinho da embarcação e vi voando lá de cima, até a água aonde estava, uma pena verde-alaranjada. Ocorreu-me na hora que deviam ser índios navegadores e que, com certeza, o tesouro estaria numa ilha tropical.


– E veio parar logo aqui? Nesta ilha, essa mesma ilha, só esta, mais nenhuma?


– Vim seguindo o rastro de penas; ora bolas!


O cocar realmente havia chegado mais magro.


Carranca sentiu-se um idiota.


– Vá logo com isso!


O velho feliz da vida quis retribuir ao quase pirata; quase porque um pirata de verdade nunca daria, sem uma luta de espadas, parte de seu tesouro.


O velho retirou do bolso uma lustrosa moeda de ouro e deu para Carranca.


Depois o velho correu para o mar, mergulhou fundo e sumiu para sempre.


O pirata de todos os mares, pela primeira vez, parou para pensar...


Pensou que não se lembrava de ter tido uma chupeta quando criança.


Seus olhos se encheram d’água; fitou Nenhumpio que já chorava silenciosamente.


Olharam-se com ternura.


– Nenhumpio, você é o único que me apóia.


– Também te amo. – desabafou a perninha, já fazendo uma poçinha no chão.


Foram embora tão felizes, mais tão felizes, que até esqueceram o tesouro.


Por outro lado, a moeda de ouro...

enfiaram no bolso da casaca.


segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Aquele dia,



abraçados pelo silêncio revelador;

tentei destilar as intenções de Luz.

Ela simulava indiferença – coisa de menina.

Endurecendo a expressão para evitar um ato de êxtase,

buscou uma feição plana de manequim.


O sentimento gélido ignorava a gravidade,

podíamos estar levitando como borboletas sonâmbulas.

O coração crepitava,

ouvíamos a corneta dos anjos

Seguravam minhas mãos no escuro quando criança


Num lapso, uma vertigem

Desfigurava-se

a imagem da mulher a minha frente,

porque ali tínhamos deixado de ser inocentes.

Desejo Vontade Necessidade.

Queria gozar daquela turgidez alucinógena...

Um estupor de coma.

IDcavalo


Muitas vezes,

nos casamos com nossas doenças.

Nossos vícios...

Por que ser sadomasoquista?

Cavalgamos neles acreditando ter as rédeas,

mas se realmente eles quiserem nos guiar

Danou-se.

O cavalo é bem mais forte.

É como uma fome úmida,

capaz de deixar os lábios grudados,

ai nos calamos náufragos.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Imprevisão do gozo: sucção sem objeto



Quisera ser a serpe veludosa
Para, enroscada em múltiplos novelos,
Saltar-te aos seios de fluidez cheirosa
E babujá-los e depois mordê-los...


Carnais, sejam carnais tantos desejos,

O sangue impuro e flamejante
Carnais, sejam carnais tantos anseios
Ressurges dos mistérios da luxúria,
Em seu torso lúbrico de bacante


Do gozo haurindo os venenosos sucos

Entre os silfos magnéticos e os gnomos
Amores mais estéreis que os eunucos!


Numa espiral de elétricos volteios,
Na cabeça, nos olhos e nos seios
Fluíam-lhe os venenos da serpente.


Era a dança macabra e multiforme
De um verme estranho, colossal, enorme,

Do demônio sangrento da luxúria!


E fico absorto, num torpor de coma,
Na sensação narcótica do aroma,
Dentre a vertigem túrbida dos zelos.


És a origem do Mal, és a nervosa
Serpente tentadora e tenebrosa,
Tenebrosa serpente de cabelos!...

(Partes holísticas - Cruz e Souza)

domingo, 5 de outubro de 2008



Não tenho mais pele
só me resta o ressecamento
do rosto entrevado pelo tempo







É madrugada... mais uma vez
recebo a visita da obstinada companheira
que me corta as pálpebras em absoluta solidão
Minha estrutura de homem cai comum chiado
a ressonância insuportável das cordas



Deitado em octaedros de pedras
Iludido por um fino lençol verde musgo
Não consigo, tenho que me manter acordado
Levanto arrastando um pouco o lençol
Abro um livro com uma capa de pessoas azuis, um pouco estranhas, derretido, escorregadio.


Uma delas aspirava um cigarro enchendo os pulmões, de maneira que seus seios avolumavam-se por sobre o decote de renda portuguesa; as pernas cruzadas, alinhadas em diagonal.
Aaah (gemia! e como) desenvoltura singular, num voluptuoso biquinho, tragava magistralmente o cigarro

Tinha uma piteira enorme e negra.
Sempre tive esse sonho: uma piteira enorme e negra.
Dizem que é coisa de mulher!
O charmoso mistério da mulher está no cigarro... ou na piteira?


Uma vez, estava quase crescido, uma menina chamada Paula me disse: “você é um garoto simpático, e mais nada.
Entre aborrecido e contente pensava no “mais nada”. Talvez fosse melhor que ser simpático; nada impressionante.
Pobre moça. Vivia escondendo sua feminilidade com tenizões, camisas estampadas e jeans.



Coitada.


começo a ter pena dela, talvez quisesse ser outra pessoa
Sentir de outra maneira, pensar outra coisa...


Um lugar estranho a sedução
Sempre tive esse sonho: ser sedutor
mas Como? Cheio de pêlos nas costas.
Arrancaria um por um se fosse possível
Eu vivia de camisão para esconder minha masculinidade.

Começo a ter pena de mim pra mim.

Sempre tive esse sonho: um lugar escuro, desconhecido. Lá não se sabe o que se pode achar. Inconsciente de meus atos. Sempre acordava do mesmo jeito
Com o mesmo livro aberto na mesma página. Não sei o que está escrito naquela página, normalmente, só me recordo da capa.
Ao acordar, folheio o livro... sempre no canto direito da página não consigo me lembrar do número.
tem uma marca de caneta, um simples traço ininteligível; olhando para todos, apenas formam um grupo de traços desconhecidos entre si. Ninguém sabe para que servem, nem para onde vão. São só traços. desprovidos de elo-elo-elo
Mas o nome do livro (esse sim) pode ajudar em alguma coisa: os prêmios, algo assim

sexta-feira, 3 de outubro de 2008




Dormindo... acordada
Pensando em sonho
Real
Encontro imediato
Você 
Passivo entrelaçado 
Coagido
Pela fúria da paixão
Tocou meu corpo 
Incandescente
Transcendental
Da razão e do espírito
Enamorados 
Pela força iminente 
Invasora
Desprovida de controle
Sopro tênue de volúpia
A vida se fazendo inteira, cíclica 
Inevitável
De amigo vira amante
Doravante
Embriagar-se de prazer
Marcou seu nome em minha pele
Sem querer