ENXERGAVA TUDO PRETO, PONTILHADO COMO SE TIVESSE CAIDO EM UM APARELHO FORA DO AR, CHAPISCADO CALEIDOSCÓPIO NEGRO DE VERÃO. SENTADA NO BARCO CONTINUEI IMÓVEL DE CORPO, POR QUE A MENTE TINHA A VORAZ ÂNSIA DE ESCREVER QUALQUER COISA, QUALQUER LINHA ABSURDA, DESNUDA, AGUDA , FELPUDA, CASACUDA, LÍRICA, TESUDA, CARNUDA, DUVIDOSA, ASQUEROSA, SEI LÁ...

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

ÁGUA NEGRA

OS 5ELEMENTOS:

elemento nada°°° porque eu não consigo achar esse número

EU, EU MESMA E PARTE DE UM OUTRO EU

Argonautas do pôr do Sol

Tormenta, lá vem o vendaval...

Gansos em movimento

BANQUETE BARANGANSTOCK

ALIGÁTORS IN CONCERT

ALIGÁTORS SIDE-SCENES

Régia Vitória Beija o Sapo

ÊLAIAH LAIAH ÊLAIAHLAIAH... LALALALALALALALA

em alguma Caixa d`Água

OLHo do CÃo

Lord. Inglês e sua esposa desalmada

A marcha reta

O que aconteceu? antes do banhinho

Quinta-feira, 14 de Agosto de 2008

ÁGUA NEGRA - um brinde de sianureto

sexta-feira, 12 de setembro de 2008


elemento nada°°° porque eu não consigo achar esse número


O primeiro emprego sempre é uma experiência inesquecível. Quando completei não mais que dezesseis anos, arrumei o meu. Consegui meu contato na praia, mas também não podia ser de outro jeito, lá era meu fiel escritório. Fui fazer a entrevista em uma casa inusitada. Tinha garagem de ardósia vermelha para uns dois carros, um atrás do outro. O lugar tinha um quintal exótico, dividido pela garagem. Do lado direito era escurinho, coberto por árvores, não muitas, o suficiente. Havia um caminho de bolachas de madeira grossa feitas de jaqueira, no final da caminhada, chegávamos a um cantinho aconchegante com tocos largos usados de bancos espalhados em rodas formando círculos tão curtos e tão próximos, muitas vezes nas tangentes existentes entre as circunferências, bundas estranhas se encontravam. Do lado esquerdo era tudo clean, um espaço gramado com uma sinuca ao fundo e duas mesas interativas. Visão panorâmica do espaço. Rente às mesas avistei um parapeito com uma singela rede de pesca simulando uma parede, espécie de isolamento do teto à muretinha de concreto. Não se podia meter o braço. Penduraram na rede uma intrigante placa de CUIDADO! Achei a decoração divertida: “que doido”.
Explorando o território fui aliciada pela curiosidade e num instante estava na tal redinha. Foi quando meus olhos encontraram outros olhos resignados, que pareciam duas bolas de gude lustradas, negras cor de bismuto, o fio de luz ofuscado, intenso num constante semi-sono, lembravam um abismo de rochas preciosas. Voltando à razão, me dei conta de que eram dois pares de olhos estáticos e atentos. Percebiam a respiração de um mosquito, o desprender de um fio de cabelo, o tremer de pálpebras num piscar sem aviso. Olhos irracionais, há tempos involuntários, desalmados. Senti um desgosto supremo que me percorreu gelado do dedo do pé à cabeça: “Forró do jacaré”. A clarividência mórbida me deixou nauseada: “Execrável!”. Estranhamente, misturava-se a vertigem uma oculta satisfação: “Posso encará-los”. O casal parecia hibernar; imóveis, parados a qualquer suspiro atravessando a estrada do tempo.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

EU, EU MESMA E PARTE DE UM OUTRO EU

ÁGUA NEGRA °° quem somos nós?

Ian, meu futuro patrão, perguntou se tinha gostado de seus filhos adotivos. “Sempre dóceis aos meus ensinamentos”, disse rebolante. Respondi que sim com um sorriso entreaberto sem graça, denunciando a surpresa. Talvez, em uma tentativa de se redimir, Ian me mostrou seus outros hóspedes, a dispensa da casa: gansos robustos com laivos de um azul meio metálico do céu, porquinhos da Índia que gritavam como tenores quando ameaçados, hamsters astutos que formavam pirâmides um montando no outro para iludir os jacarés, pintinhos punks coloridos, galinhas bojudas na ânsia de voar. Era a comida mais animada que já vi. Como se passassem a eternidade anestesiados pela gula tornando-se adiposos e deliciosos. E por não estarem distraídos, eram devorados. Que morte mal resolvida, “Será que doía?”. Meu assombro foi perceptível, como consolo, Ian disse que eles não sentiam dor. Acabei me acostumando, o segredo foi não criar vínculos com os moradores, fingia que nem moravam ali e tampouco assistia ao episódio sangrento. Sabia, mas me encobria de não saber, melhor assim. 

sábado, 6 de setembro de 2008

Argonautas do pôr do Sol

ÁGUA NEGRA°°° o pôr do Sol antes da Tormenta
O animal, cujo homem dos anos setenta mais estimava, era um ganso chamado Camilo, e não os jacarés. Certa vez, perguntei por que o nome Camilo; Ian disse que teve certeza de ser uma gansa: Camila. Anos de convivência depois, um amigo integrado na sexologia dos gansos foi capaz de libertar o animal de viver num cataclismo: a dupla personalidade devido à crise de identidade sexual. Mesmo depois de saber o sexo do bichano, continuei a achá-lo assexuado, porque ele nunca se interessava por nenhuma fêmea, o coração meio apagado, alheio ao alvoroço de todas.
Na realidade, Camilo e Ian formavam uma dupla inseparável; passeavam juntos, comiam, andavam de bicicleta, conversavam ao pôr-do-sol, na rua, praia... Ah! Tudo que se faz com um parceiro. O repentino amor – o acima! Um relacionamento invejável, como se tivessem nascido um para o outro. O ganso para o homem e o homem para o ganso. Quem sabe se de repente continuasse a ser Camila tudo seria diferente; provável, não combinariam.
Foi uma fase alegre de minha vida. Todo o fim de semana estava lá, no caixa, era bem tratada e me divertia. Uma maravilha! Até Camilo participava do forró, o bichano já era popular, sentava direto com a gente no bar. Sim, o ganso sentava no banco e só faltava alçar a voz. Em dias em que estava meio alta, chegava a imaginá-lo sofrendo metamorfose, permutando-se a uma figura antropomorfa “o ganso de fraque e charuto”. Havia torrentes de risos quando alguém virava para o ganso e dizia “Fala ai meu irmão!”. Acho que um desejo inconfesso e consensual era que Camilo falasse.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Tormenta, lá vem o vendaval...

°°° °° ° ``°° °° ``° ° ``°°°°``°``°°°``°°°``° °`` ° ° °° °°°°``°°°``° °°°````°
ÁGUA° NEGRA °° uma°°° chuvinha° antes°° do° 1 elemento°°°
Esse momento durou meses ou talvez anos, na adolescência é assim; o tempo corre pingado... a gota quando é grande e demorada fica insuportável, mas quando é fina e refrescante é uma delicia. No forró do jacaré, meus momentos foram uma chuva rala e cristalina como se fizesse poesia. 

GANSOS EM MOVIMENTO

ÁGUA NEGRA° até quase 1 elemento

Mesmo que me sentisse algumas vezes cúmplice de uma atrocidade ambiental, cheguei a acreditar na felicidade dos jacarés por estarem ali e talvez feito Camilo adorassem o forró. A paralisação eterna que me incomodava, era nada mais que a forma desses animais de encarar a realidade. Viviam em outro tempo também carregado de vida, outro universo profundo e introspectivo “o mundo dos jacarés”. Todos os movimentos que eles economizavam eram compensados pela iluminação de sua percepção apuradíssima à mínima manifestação de existência nos arredores. E todo o dia visitava-os repetidamente e espantava-me diante do esplendor daquele mundo.   Quem garante se não estivessem lá viveriam melhor? É! O espaço era pequeno, o laguinho rasinho – tinha esquecido o laguinho -, a comida variava razoavelmente e recebiam visitas indesejáveis. Mas ninguém pode ter tudo, todo mundo tem problemas e já passou por coisa semelhante. Eu admito, não ignoro a dor e o desamparo e até posso estar sendo tendenciosa, mas a relação entre Ian e Camilo, sem dúvida comovente, fora um exemplo de amor entre as diferenças. De que o amor não existe só entre os semelhantes. Em lições como esta, descobrimos em nós o maravilhoso mel de cada dia.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

BANQUETE BARANGANSTOCK

ÁGUA NEGRA °° .... entreum e outro elemento
Se os jacarés pudessem andar na rua, Ian não os levaria sem problemas? Talvez nunca tivesse feito o convite, pois sabia que aceitariam sem titubear. Idealiza a confusão... se até aquela velha gorda remelenta, que diziam ter chorado quando bebê na barriga da mãe, ao levar aquele coelho gigante na coleira assusta uma penca de vizinhos. Imagina o Ian saindo com um jacaré agarrado em cada mão. A cidade para. As pessoas não estão acostumadas a tal espetáculo. O homem não era mau, pelo contrário, parecia da filosofia paz e amor, adepto do amor livre, andava meio hippie, cheio de panos coloridos, largado, rasgado na manga do paletó. Devia amar a todos na mesma intensidade, de tão sentimental. Aprendi a gostar dele assim, absolvido por seu espírito excêntrico.